sexta-feira, 17 de maio de 2013

"Imagem é tudo": Mimmo Cattarinich (Revista "e" - SESC-SP)


Na Revista "e" nº 131 (abril de 2008), publicada pelo SESC-SP, o fotógrafo italiano Mimmo Cattarinich conta como foi fotografar pessoas como Sophia Loren e Maria Callas.

Confiram!

Carmem Toledo.





"Imagem é tudo"
O fotógrafo italiano Mimmo Cattarinich fala sobre seu papel nos sets de filmagens




"Ao longo da carreira, o fotógrafo italiano Mimmo Cattarinich esteve presente nos sets de filmagem de alguns dos maiores cineastas da Itália e do mundo. Quando o espanhol Pedro Almodóvar dirigiu a atriz Victoria Abril sentada em um vaso sanitário, ele estava lá. Quando o italiano Federico Fellini montava alguma de suas geniais situações, Cattarinich documentava-a com sua câmera. Depois que o também italiano Píer Paolo Pasolini achava o resultado desejado, muitas vezes era o fotógrafo que registrava isso. Embora seja modesto em relação ao trabalho com os grandes mestres - "Eu me limitei, simplesmente, a fotografar", conta -, o fato é que Mimmo construiu um currículo estrelado dentro e fora dos estúdios. A atriz Sophia Loren, a cantora Maria Callas, o cineasta Bernardo Bertolucci, entre outros notáveis, foram figuras de seu convívio, pessoal ou profissional. "Essas pessoas eram tão talentosas que nunca se preocuparam com a câmera fotográfica", revela na palestra que deu no Sesc Pinheiros por conta da exposição O Mago da Luz, que reúne algumas dessas imagens, em cartaz na unidade até o dia 20 deste mês. "Sophia Loren sempre me mandava beijinhos de longe, em sinal de reconhecimento. E quem melhor do que ela para saber se estava sendo bem-fotografada ou não?" A seção Depoimento desta edição traz trechos editados do encontro no qual Cattarinich falou do estilo de filmar de Fellini e Pasolini, do comportamento acessível de Sophia Loren, e relatou alguns fatos curiosos de sua carreira.

Cada diretor com quem trabalhei, naturalmente, tinha uma forma diferente de se comportar. Era interessante observar cada comportamento, as atitudes. Fellini, por exemplo, era um homem muito direto. Ele extravasava, de forma divertida, gostava de comer, por exemplo.

Gostava das mulheres. Como ele compartilhava muito esses momentos, seu set era sempre um divertimento. Houve tantos atores extraordinários que vieram da América para Roma, e aonde eles queriam ir? Isso demonstra o que era estar em um set de um filme de Fellini, era como receber medalhas. Porque na ocasião de um Oscar, de uma premiação qualquer, colegas meus de profissão me diziam: "Nossa, você é amigo do Fellini!". Eu me sentia importante, era um prêmio para mim. Os diretores de todos os jornais italianos e estrangeiros pensavam que, já que eu trabalhava com Fellini, eu devia ser bom no que fazia.

Pasolini tinha um comportamento absolutamente diferente. Eu trabalhei muitos anos com ele, no set e também fora. Víamo-nos muito. Diferentemente de Fellini, seus filmes não foram de imaginação e fantasia. Seus primeiros filmes, especialmente, contavam enredos sociais que colocavam os espectadores diante de problemáticas que precisavam ser consideradas. Pasolini não recebeu medalhas ou prêmios como outros homens da cultura italiana.



"A fotografia no set é documental. Esse tipo de fotografia é criativa, claro, mas ela registra o que está se passando na cena. Portanto, trata-se de documentar um evento, não de construir uma imagem de A a Z"



Inteligência ilustre

Ter contato com pessoas como Sophia Loren e Maria Callas, tendo feito um trabalho também como jornalista, me fez perceber que existe uma diferença entre se relacionar com uma figura quando você escreve sobre ela e quando você a fotografa. Eu me relacionei com elas no campo da imagem. Essas pessoas eram tão talentosas que nunca se preocuparam com a câmera fotográfica. É preciso deixar claro: essas pessoas são muito disponíveis quando percebem que quem está em frente a elas com a máquina filmadora ou com a máquina fotográfica conhece bem a profissão. Fazem pose quando vale a pena e evitam fazê-las, no sentido mais amplo da palavra, quando as coisas não funcionam bem. Porque todos eles são inteligentíssimos. Portanto, eles percebem quando alguém quer fazer algo contra eles ou quando o profissional, por mais que faça uma imagem que interesse aos jornais - que pagam muito por isso -, não está interessado em causar dano nenhum. Eu nunca fotografei Marlon Brando ou Robert De Niro, por exemplo, que são amigos meus, mas posso afirmar que eles sabem quem está por trás da câmera.


Mais Sophia...

Eu conheci Sophia Loren há 53 anos. Mais de meio século atrás. Ela sempre foi uma pessoa absolutamente disponível, com seu ambiente de trabalho, com seus parceiros de trabalho, com os diretores, enfim, com todos. De fato, ela é uma pessoa extraordinária em todos os sentidos. Todas as pessoas que a conheceram sempre a reconheceram como uma ótima companheira de viagem. Muito boa como atriz, excelente como pessoa. Eu não a fotografei propriamente. Sempre estava como assistente de fotógrafos que a estavam fotografando. Mas, independentemente disso, ela sempre me mandava beijinhos de longe, em sinal de reconhecimento. E quem melhor do que ela para saber se estava sendo bem-fotografada ou não?


Ponto de vista

A fotografia no set é documental. Esse tipo de fotografia é criativa, claro, mas ela registra o que está se passando na cena. Portanto, trata-se de documentar um evento, não de construir uma imagem de A a Z. É importante seguir a forma de fazer, e documentar aquilo que ocorre no set, procurar ver as coisas na maior luz possível, a que está lá, porque, se tivermos que refazer as coisas de forma diferente, não é mais um registro da cena. A propósito, houve diretores, [Michelangelo] Antonioni, por exemplo, que queriam que o fotógrafo pudesse ver bem a cena, para não perder absolutamente nada. Mas o resultado era muito estático, não passava envolvimento da imagem com a cena. Já no caso de [Mario] Monicelli, eu sempre perguntava para ele: "O que você acha disso, daquilo (...)?". Ele me dizia: "Não me faça ver nada. Não quero ver nenhuma foto, pouco me importam as fotos". Portanto, o que eu posso dizer? Trabalhar para todos esses diretores significou mostrar o meu ponto de vista das cenas. Porque todos os elementos que as compunham já tinham sido pensados antes. Eu me limitei, simplesmente, a fotografar. Agora a curiosidade dessas fotos está em ver esses atores que fazem parte da história do cinema."




Revista "e" - SESC-SP, nº 131, abril de 2008

Autoria

O blog "Sophia... Ieri, Oggi, Domani" (sophiaierioggidomani.blogspot.com) é de autoria de Carmem Toledo. Está proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo aqui publicado, inclusive dos disponibilizados através de links aqui presentes. A mesma observação se estende a todos os blogs e páginas da autora ("Culturofagia", "Voz Neurodiversa", "O Caminhante Solitário") e toda e qualquer criação, seja em forma de texto ou ilustração, por ela assinada.
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